terça-feira, 24 de junho de 2025

A Arte de Habitar a Si Mesmo

Há um silêncio que assusta. Um espaço entre o som do mundo e o som de nós mesmos. A solidão, muitas vezes, se instala aí — nesse intervalo em que o outro se ausenta e somos obrigados a escutar o que carregamos por dentro. Ela não chega com alarde, mas se senta ao nosso lado como quem já nos conhece há muito tempo. E, de certa forma, conhece.

Aprender a viver consigo mesmo é uma das lições mais desafiadoras da existência. Fomos criados, muitas vezes, na ideia de que a plenitude está no encontro com o outro — no amor romântico, na família, nos amigos, no grupo. Pouco se fala sobre o valor do encontro consigo, esse diálogo íntimo e necessário, que não precisa de plateia nem aplausos.

A solidão, quando não é escolha, pode doer como ferida aberta. Mas, quando acolhida e compreendida, pode ser uma mestra generosa. Ela nos obriga a parar, a questionar, a revisitar o que somos sem a presença de um olhar alheio. E nesse mergulho — que nem sempre é suave — descobrimos que há uma casa dentro de nós pedindo para ser habitada.

A verdade é que muitas vezes nos tornamos hóspedes de nossas próprias vidas. Vivemos para fora, para os compromissos, para os afetos, para os desejos do mundo. E esquecemos o essencial: viver conosco. Estar só não é estar vazio — é, muitas vezes, estar cheio demais e não saber organizar o que transborda.

Viver consigo é um aprendizado diário. É perceber que nossos silêncios também falam, que nossas sombras ensinam, que nossas cicatrizes contam histórias. É saber preparar um café só para si e saborear o momento como quem celebra algo sagrado. É dançar sozinho na sala, ler um livro em voz alta, rir de si sem precisar de testemunhas.

Não é fácil. A convivência com o próprio eu exige coragem. Exige encarar o que evitamos, abraçar o que rejeitamos, perdoar o que julgamos imperdoável. Mas, à medida que esse laço interno se fortalece, nasce uma liberdade que nenhuma companhia substitui: a de estar em paz dentro da própria pele.

Como escreveu Clarice Lispector: “Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, depende de quando e como você me vê passar.” Que possamos, então, ver a nós mesmos com esse olhar generoso — capaz de acolher as brisas e ventanias que nos habitam. E, assim, transformar a solidão em companhia, e a companhia em encontro.

Porque, no fim das contas, viver consigo mesmo não é apenas um destino — é um retorno. E todo retorno, por mais solitário que pareça, é um reencontro com o que há de mais profundo: a nossa própria essência.

#solidão #Viver


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